sábado, 15 de junho de 2013

Vendo de fora

Eu sou coxinha. Confesso. Classe média, burguesinha, medrosa, coxinha. Eu sempre disse que o Brasil precisa implodir e começar de novo, que não tem solução. Eu acredito que manifestação é inútil, um bando de vândalo achando que vai mudar o mundo. Eu sinto vontade de bater a cabeça na parede quando penso na "atual conjuntura" e gostaria que todo mundo que conheço saísse do país e viesse me fazer companhia, deixando o Brasil pros vagabundos, pros marginais, pros criminosos. Eu acredito também que é minha culpa, culpa da minha geração de coxinhas, que nunca reivindicou nada, que é nossa culpa que estamos nesse estado de calamidade. Eu fui ensinada a respeitar autoridade e sou feliz em saber que a polícia existe pra nos proteger.

Eu acompanho as notícias do Brasil com fervor e até quarta-feira, conversava com meus pais e chamava os manifestantes de São Paulo de vândalos, criminosos, com razão, porque destruir propriedade alheia é de tamanha maldade e falta de caráter, que anulava qualquer outra causa, afinal, protestar contra o aumento da tarifa causando danos aos transporte é, no mínimo, contraproducente. Eu sou coxinha e estava incrédula da vida, como sempre fui.

Aí chegou a quinta/sexta-feira e eu passei o dia acompanhando a manifestação, os relatos, a violência da polícia e a surrealidade de tudo acontecendo sem motivo, ali na porta da minha casa, em ruas onde andei muito, cujos buracos e lojas eu conheço na palma da mão. Eu senti na minha carne a ferida da cidade onde nasci. Ferida não pela população, mas pela mão pesada e sem compaixão da Polícia sob ordem.

Eu fiquei com medo, de repente, não da manifestação, mas da Polícia. Fiquei com medo da Polícia. Medo da minha mãe estar passando, do meu irmão, do meu pai, da minha tia, minha cunhada, todos que moram ali, deles estarem na rua e serem atingidos não pelos manifestantes, mas pela tropa de choque. Medo da Polícia maltratar minha família.

Então, depois de um dia de sofrimento e conflito, em Sp e aqui dentro de mim, eu deixei de ser coxinha e passei a ter esperança, passei a acreditar que a minha geração de coxinhas finalmente desengasgou e vamos tentar melhorar, pro futuro ser um pouco melhor.


Porque essa pra mim foi a gota d'água que transbordou o copo. Eu aguento a falta de caráter, a corrupção, o trânsito, o que eu infelizmente não posso controlar. Mas não aguento e não permito, que a Polícia seja a vilã da livre-expressão. Não posso entender, no meu país, na minha cidade, ter medo de falar o que penso, de tentar mudar, de tentar melhorar, e ter que ter medo. Medo da Polícia. Medo de ser preso por carregar vinagre. Medo de ser preso por querer melhorar a vida de todos.

(Em tempo, a generalização é absolutamente corporativa, a entidade que a Polícia estava ali representando, as ordens que receberam e tiveram que cumprir. Conheço policiais, são a minha família, e são pessoas do melhor calibre possível, a quem confiaria minha vida.)

 E se eu estivesse hoje em SP, participaria do próximo evento e vaiaria a Presidenta, sem pudor e com orgulho. Porque a gente pode aguentar muita coisa, mas não vou ficar parada enquanto o medo tira a minha liberdade de expressão. Não é mais só por $0.20, é pra não ter mais medo.


Brasil, ame-o ou deixe-o. Eu o deixei, mas ele nunca me deixou.


Um comentário:

Elaine Campelo disse...

Nossa amiga.....yuhuhuh